Brasil sedia conferência da Iosco sobre educação de investidores
Em entrevista exclusiva, João Pedro Nascimento, presidente da CVM e anfitrião do encontro, reafirma parceria da autarquia com a ANBIMA no letramento financeiroO Brasil sediou a conferência do comitê C8 da Iosco (Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários) nos dias 21 e 22 de novembro. O grupo formado por reguladores do mercado financeiro de várias partes do mundo tem a educação de investidores de varejo como principal tema de estudo. A CVM foi a anfitriã do encontro, em São Paulo, com participação do presidente da autarquia, João Pedro Nascimento.
Entre os temas tratados na reunião, a ANBIMA participou com apresentações das edições mais recentes do Raio X do Investidor Brasileiro e do Finfluence, dois dos principais estudos que desenvolvemos: o primeiro, anualmente, para acompanhar o comportamento de pessoas investidoras; e o segundo, que a cada seis meses explora a atuação de influenciadores de finanças nas redes sociais. "A expertise e diversidade da ANBIMA posicionam a Associação como importante parceira da CVM, e também do C8, podendo contribuir de maneira significativa para o avanço de objetivos comuns, tais como o fortalecimento dos mercados de capitais globais, a promoção da educação financeira e a implementação de práticas regulatórias e de governança cada vez mais concretas", disse João Pedro em entrevista exclusiva. Confira a íntegra:
Foto: CVM
1. Qual a importância de o Brasil receber a reunião do C8? Com qual periodicidade essa reunião acontece e quais são os principais assuntos tratados?
João Pedro Nascimento: A higidez do mercado de capitais brasileiro e o fato de o nosso país estar na liderança e na vanguarda de temas globais, tais como a economia verde, tem permitido que as diversas nações compreendam a importância do Brasil para o desenvolvimento econômico mundial. Também neste sentido, a educação financeira da população, mais do que nunca, se apresenta como pilar essencial para o funcionamento eficiente e inclusivo do segmento, desempenhando um papel relevante no empoderamento dos cidadãos.
Além do seu principal mandato, que é operacionalizar as políticas da Iosco voltadas para a educação financeira e capacitação do investidor de varejo, o C8 também é responsável por assessorar o board da organização em questões emergentes sobre a proteção desses investidores, bem como conduzir os diversos projetos relacionados. Durante as reuniões, discutimos essas políticas e avaliamos os desafios da educação financeira em nível mundial.
A CVM, em parceria com os países do C8, está comprometida em fomentar uma sociedade financeiramente consciente, capaz de utilizar o mercado de capitais como um instrumento de desenvolvimento de políticas públicas. Anualmente são realizadas de duas a três reuniões presenciais do C8, além de encontros virtuais (exceto no período da pandemia de Covid-19, quando as reuniões presenciais tiveram que ser suspensas temporariamente). O Brasil não sediava uma reunião presencial de comitê de política da Iosco há aproximadamente dez anos.
Em geral, as reuniões presenciais do C8 são precedidas de conversas prévias dos grupos de trabalho do comitê, que atualmente tratam de: finfluencers, criptoativos e Semana Mundial do Investidor. O encontro também prevê a discussão de assuntos emergentes, novos projetos, iniciativas de educação financeira e trocas de experiências entre as jurisdições participantes.
2. Quais são desafios da educação financeira identificados pelos países que fazem parte do C8? Como resolvê-los?
JPN: Os países que integram o C8 enfrentam desafios comuns, embora com naturais variações regionais e culturais. Podemos citar questões relacionadas à inclusão e ao letramento financeiro; à necessidade de maior conhecimento dos mercados financeiro e de capitais por parte da população; aspectos voltados à inclusão digital; e atenção no entorno do que eu costumo chamar de overload information (“excesso de informação”), que tende, inclusive, a gerar desinformação.
O fortalecimento de programas para educação financeira e capacitação de investidores também são essenciais em um momento em que, em muitas jurisdições, a responsabilidade pela formação de poupança voltada à aposentadoria, por exemplo, está migrando do empregador para o indivíduo. Ou seja, consciência e conscientização precisam estar no radar das sociedades.
3. Qual é o papel e de que forma as entidades reguladoras, como as que fazem parte do C8, podem atuar para a disseminação da educação financeira?
JPN: As entidades reguladoras, como as que compõem o C8, desempenham um papel essencial na promoção da educação financeira, um componente-chave para o funcionamento eficiente e inclusivo dos mercados de capitais. Além de regular e supervisionar as atividades financeiras, essas entidades têm um papel importante ao estimular a capacitação dos cidadãos no que diz respeito à tomada de decisões conscientes e informadas, protegendo-os de riscos e fortalecendo a confiança no mercado.
Costumo dizer que “ninguém faz nada sozinho”. Assim, a partir do diálogo, da escuta ativa, da construção coletiva, e por meio de programas colaborativos, uso de tecnologia e foco na inclusão, por exemplo, reguladores, autorreguladores e participantes do mercado podem transformar a educação financeira em uma ferramenta de empoderamento e crescimento econômico sustentável.
4. Qual a contribuição do Brasil ao grupo?
JPN: A CVM assumiu a presidência do C8 em janeiro de 2016, quando foi eleita para completar o mandato que se encerrou em outubro, após reunião do board, em Hong Kong. A CVM foi o primeiro regulador de mercado emergente a presidir um dos comitês de políticas da Iosco, todos liderados por reguladores de países com mercados mais desenvolvidos. Em outubro de 2016, a CVM foi reeleita para seguir até 2018, tendo também obtido um novo mandato até 2020. A partir de 2021, a presidência do C8 passou a ser exercida pela Consob (Comissão Nacional para a Sociedade e a Bolsa), da Itália.
O Brasil desempenha papel estratégico nas discussões e iniciativas do C8. Nossas contribuições refletem a experiência adquirida em um mercado dinâmico, caracterizado pela interação entre inovação, regulação desenvolvimentista e inclusão financeira. Essa abordagem não apenas eleva o Brasil como referência, como também fortalece a cooperação global para construir mercados de capitais mais hígidos, resilientes, acessíveis e democráticos.
5. Como entidades como a ANBIMA podem colaborar na agenda da CVM e do C8?
JPN: Vou aproveitar esta perguntar para reiterar o que sinalizei anteriormente: “ninguém faz nada sozinho". A ANBIMA, uma das associações mais plurais do nosso mercado, desempenha papel estratégico no desenvolvimento do segmento. Sua expertise e diversidade posicionam a Associação como importante parceira da CVM, e também do C8, podendo contribuir de maneira significativa para o avanço de objetivos comuns, tais como o fortalecimento dos mercados de capitais globais, a promoção da educação financeira e a implementação de práticas regulatórias e de governança cada vez mais concretas.
Após a conferência no Brasil, o próximo encontro presencial do C8 será realizado em Singapura, no primeiro semestre de 2025.