Avanços tecnológicos colocam desafios para a supervisão dos mercados financeiros
Mercados SecundáriosTecnologia e High-frequency Trading
Os benefícios proporcionados pelos avanços na área de tecnologia da informação e na própria tecnologia de ambientes e sistemas de negociação sobre os mercados financeiros são amplamente reconhecidos, haja vista a expansão significativa dos volumes e da frequência dos negócios, a difusão de plataformas eletrônicas e o aperfeiçoamento dos sistemas de segurança da informação, dentre inúmeros exemplos. Do ponto de vista regulatório, contudo, estes desenvolvimentos não trouxeram apenas benefícios, mas também suscitaram riscos, associados às condições operacionais e de transparência, fragmentação dos mercados, possibilidades de manipulação dos negócios etc. – riscos estes até de caráter sistêmico.
O flash crash americano em 2010, a oferta pública inicial da BATS no início de 2012 e o episódio do Knight Capital Group em agosto de 2012 são exemplos concretos destes riscos.
Os desenvolvimentos tecnológicos também fizeram emergir uma série de desafios para a efetiva regulação e supervisão destes mercados. Nesta direção, o G-20 estabeleceu como uma das frentes de sua agenda de reforma financeira global a avaliação dos riscos à integridade e eficiência dos mercados trazidos pelo desenvolvimento tecnológico, incumbindo a IOSCO elaborar matéria específica sobre o tema. Em outubro de 2011, a entidade reuniu, em um primeiro relatório, as principais questões regulatórias relativas ao impacto da tecnologia sobre os mercados. Além dos riscos já citados anteriormente, o documento identifica e dá destaque aos negócios de alta frequência (HFT – high frequency trading) como um dos desafios fundamentais da supervisão dos mercados e propõe recomendações correspondentes ao acesso à informação dos ambientes de negociação pelos reguladores e aos padrões de controle que devem ser exercidos sobre estes ambientes, incluindo os sistemas de negócio e algoritmos. Além disso, o relatório alerta sobre a necessidade de contínua avaliação dos impactos tecnológicos, diretos ou indiretos (como, por exemplo, potenciais formas de manipulação), sobre a integridade e eficiência dos mercados.
Prosseguindo em seu mandato sobre o tema, a IOSCO divulgou, para consulta, em 22/8, relatório sobre os desafios que a tecnologia impõe para a supervisão dos mercados, especificamente sob a ótica dos reguladores/supervisores. O documento analisa os efeitos dos avanços tecnológicos sobre a capacidade dos reguladores de monitorar efetivamente os mercados, destacando as dificuldades representadas pela maior complexidade e maiores volume e velocidade dos negócios, bem como da interconectividade dos sistemas, tanto no que se refere a diferentes classes de ativos financeiros, quanto à fragmentação, em nível global, das transações.
As preocupações se dividem, basicamente, em duas categorias. A primeira relativa à manutenção de um regime de supervisão efetivo no escopo de cada país, bem como entre as diferentes jurisdições. O documento enfatiza este ponto, colocando a supervisão transfronteiriça como o principal desafio a ser enfrentado. A segunda categoria se refere à dificuldade crescente de fiscalização, em especial, em dois pontos: (i) a coleta de dados, incluindo aí a potencial inadequação do conteúdo das informações requeridas e os custos, potencialmente elevados, de armazenamento destas informações, ante sua amplitude; (ii) o tratamento destes dados, relativamente ao seu uso, efetivo, para a supervisão dos mercados, em particular, tendo em vista a proposta de identificar os agentes envolvidos em cada nível dos negócios.
A supervisão inter-jurisdições, em especial, depende do sucesso dos reguladores em promover a uniformização de sistemas de rastreamento (audit trail system) e dos dados por eles providos e a sincronização dos relógios destes sistemas, de modo a garantir o pronto acesso às informações com significado econômico. Neste sentido, o estabelecimento de acordos e MOUs (memorandum of understanding) entre os diferentes reguladores é apontado como solução a ser encorajada.
Exemplos práticos destas preocupações estão cada vez mais presentes na agenda regulatória global. A SEC americana sancionou, em julho, regra que obriga os autorreguladores locais a consolidar os sistemas de rastreamento dos diferentes ambientes de negociação existentes no país. Já na Europa, foram aprovados: pelo Parlamento europeu, no final de setembro, uma série de restrições aos negócios de alta frequência; e na Alemanha, dispositivo que estabelece a obrigatoriedade de identificação dos agentes que conduzem negócios neste esquema, visando impor futuras restrições a estas operações.