Mercado se movimenta para avançar agenda ESG
Os compromissos globais com emissões líquidas zero (net zero) vêm registrando saltos expressivos. Durante o PRI in Person 2024 (fórum global sobre investimentos responsáveis realizado pelo PRI, iniciativa da ONU para promover adoção de fatores ESG no mercado de capitais), Mark Carney, enviado especial da ONU para Ação Climática e Finanças, co-presidente da GFANZ e presidente da Brookfield Asset Management, apresentou dados que reforçam como a transição climática está impactando a rentabilidade dos investimentos.
Carney destacou que empresas que estão liderando a descarbonização apresentam um retorno médio de 23% entre 2020 e 2023. Em comparação, sem citar números, lembrou que companhias que estão atrasadas nesse processo (as chamadas "laggards") têm mostrado um desempenho financeiro significativamente inferior. O diferencial ressalta o crescente retorno para empresas que se comprometem com a transição para a economia de baixo carbono, reforçando a vantagem competitiva das líderes ambientais
Esse consenso sobre a importância da transição climática já havia sido reforçado durante a Climate Week, realizada em Nova York, onde o setor privado foi identificado como um dos principais agentes impulsionadores de soluções climáticas. A Climate Week é uma das maiores conferência sobre mudanças climáticas que reúne centenas de eventos, debates e encontros simultâneos para impulsionar a transição para uma economia de baixo carbono.
Compromissos com emissões líquidas zero (net zero) no cenário global registraram saltos expressivos nos últimos quatro anos. (Fonte: Brookfield Asset Management)
A aceleração da transição para o net zero é visível globalmente, uma vez que o número de países com compromissos cresceu sete vezes entre 2020 e 2024, enquanto as empresas comprometidas aumentaram dez vezes. Esse impulso também se reflete no aumento dos compromissos financeiros para o net zero, que cresceram 30 vezes no mesmo período.
De acordo com Brian Hensley, sócio da Kaya Partners, a compensação das emissões globais por Sistemas de Comércio de Emissões (ETS, na sigla em inglês) deverá superar 25% pela primeira vez em 2024. Os ETS permitem que empresas compensem suas emissões de gases por meio da compra e venda de créditos de carbono. Em regiões como a Ásia e Pacífico, esses sistemas já estão avançados.
Cabe observar que os mercados de carbono exercem um papel relevante no processo de transição das empresas, mas cumprem uma função auxiliar nas jornadas net zero das empresas, uma vez que o conceito vai além da compensação e consiste basicamente na redução de emissões. O mecanismo, contudo, é um recurso relevante para o financiamento de projetos voltados para a descarbonização.
O Brasil ainda aguarda decisão do Congresso sobre a aprovação do projeto que regulamenta o funcionamento de um mercado regulado de carbono, o que representa um custo de oportunidade para o país. No último dia 14, foi divulgada uma carta aberta assinada por 60 lideranças empresariais e economistas que pede aos senadores brasileiros a aprovação do projeto de lei que cria o mercado regulado de carbono no Brasil.
Divulgação além dos indicadores climáticos
Dados publicados pelo CDP (Disclousure Inside Action), organização internacional sem fins lucrativos que gerencia um sistema global de divulgação ambiental, durante o PRI in Person mostram a convergência entre clima e biodiversidade. O levantamento considerou informações divulgadas por 23 mil empresas de todo o mundo sobre os principais indicadores relacionados a mudanças climáticas, florestas, segurança hídrica e biodiversidade.
De acordo com o trabalho, apenas 10% das organizações consultadas responderam a maior parte dos indicadores solicitados pelo CDP. Porém, 38% divulgaram informações de desempenho ambiental sobre questões relacionadas à natureza além do clima, o que indica um reconhecimento crescente de que divulgar apenas informações ligadas ao clima não é suficiente.
Ao apresentar o estudo, a CEO do CDP, Sherry Madera, observou que a demanda de investidores por dados mais completos das empresas reflete a crescente pressão de consumidores e outros stakeholders por essas informações.
Entre os 20 países com o maior número de organizações que responderam o questionário do CDP, o Brasil aparece em sexto lugar. Porém, cerca de 80% das empresas brasileiras divulgaram poucas informações, conforme avaliação da organização.
Da COP 16 à COP 29: o papel da biodiversidade e do clima
No final deste mês, as atenções estão voltadas para Cali, na Colômbia, onde acontece a COP 16 (16ª edição Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Biodiversidade). Este é o primeiro grande encontro após a adoção do Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal (chamado de GBF, na sigla em inglês), em 2022, que estabeleceu 23 metas ambiciosas para reverter a perda de biodiversidade até 2030. Entre essas metas, está o aumento dos fluxos financeiros internacionais para países em desenvolvimento em US$ 200 bilhões anuais.
Essas discussões sobre biodiversidade convergem com os debates sobre financiamento climático que acontecerão na COP 29, no Azerbaijão, e na COP 30, no Brasil. No ano passado, na 28ª edição da COP do clima, foi anunciado um compromisso global inédito sobre a transição para o uso de combustíveis fósseis, destacando o papel da biodiversidade e da agricultura no contexto de uma transição energética justa e da segurança alimentar. A interligação entre clima e biodiversidade é essencial para que os países alcancem as metas climáticas e ambientais.
Em painel durante o PRI in Person que tratou do papel da natureza nos investimentos, Eduardo Bastos, presidente da Câmara Setorial de Agrocarbono Sustentável do Ministério da Agricultura, chamou a atenção para os diferenciais do Brasil na integração entre biodiversidade e clima. Segundo Bastos, o país é um dos poucos no mundo que tem condições de conciliar produção de alimentos em grande escala com a preservação da biodiversidade e projetos voltados para o clima.
O que esperar do Brasil até a COP 30?
O Brasil tem uma oportunidade única ao sediar o PRI in Person 2025 e a COP 30 no mesmo ano. Para aproveitar essa visibilidade e se posicionar como um líder global em sustentabilidade, o país precisará adotar compromissos mais concretos com a agenda climática e de biodiversidade. Isso envolve a criação de um mercado de carbono regulado e a implementação de mecanismos financeiros inovadores, em colaboração com organismos multilaterais.
Os profissionais do mercado de capitais devem estar atentos a essas movimentações, pois a transição para uma economia sustentável traz tanto riscos quanto oportunidades. Compromissos mais ambiciosos abrirão novas frentes de investimentos, especialmente em áreas como biodiversidade, agricultura sustentável e energias renováveis. Ao mesmo tempo, empresas que não se adaptarem a essas novas exigências terão dificuldade em acessar capital e se manter competitivas.
Bagagem ESG: o que o mercado de capitais viveu nas conferências?
O Brasil tem uma grande responsabilidade em 2025: a de ser protagonista na agenda ESG para que o nosso mercado de capitais seja um hub de atração de investimentos responsáveis..
Foi sobre isso que Cacá Takahashi e Denísio Liberato (ANBIMA), José Pugas (Régia Capital), Renato Eid (Itaú) e Marcelo Seraphim (PRI) falaram diretamente do PRI In Person 2024 para a Bagagem ESG, cobertura exclusiva da ANBIMA sobre os principais eventos internacionais de sustentabilidade. Assista!
Preparar o mercado de capitais e cuidar de riscos fiscais e cambiais para dar segurança aos investidores estrangeiros foi um dos temas em pauta nos eventos da Climate Week.
Cacá Takahashi esteve no encontro em Nova York e resume as principais conclusões da conferência. Assista!