Crowdfunding: nova regulação britânica e as iniciativas da Comissão Europeia
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No último número do Radar ANBIMA foi observado que o crowdfunding iria integrar a pauta de reguladores ao redor do mundo nos próximos meses. Após as iniciativas implementadas nos Estados Unidos no último trimestre de 2013 – além das respostas regulatórias já adotadas –, destacamos nesta edição uma série de acontecimentos ocorridos no primeiro trimestre de 2014 na Europa, neste mesmo segmento.
Em 6/3/14, a FCA atualizou o regime regulatório do crowdfunding no Reino Unido, mantendo o foco da regulação nas plataformas eletrônicas – ou sites da Internet – que oferecem na rede formas de financiamento coletivo. Notadamente, o perímetro regulatório da autoridade britânica é delimitado às formas financeiras de crowdfunding, tendo sido estendido àquelas operações que caracterizem a realização de empréstimos, como o peer-to-peer lending(empréstimos aos pares entre indivíduos) e o peer-to-business lending (empréstimos aos pares entre indivíduos e empresas) com o novo regime, que entrou em vigor em 1/4/14.
Sobre as plataformas incidirão regulações de conduta, em particular, sobre o regime de divulgação de informações e as campanhas de promoção (promotions), requerimentos mínimos de capital, regras de proteção aos recursos dos investidores e de resolução de disputas. Além disso, no caso específico dos financiamentos através de empréstimos, são previstos requerimentos para que as plataformas tomem medidas para assegurar a continuidade da administração dos empréstimos em casos em que saiam do negócio.
Adicionalmente, no caso do investment-based crowdfunding (que equivale ao investimento em valores mobiliários), as regras britânicas restringem a oferta de financiamentos coletivos através de plataformas a determinados tipos de investidores, de modo a salvaguardar os investidores em geral dos riscos de investimento em valores não listados (usualmente, oriundos da dificuldade de precificação e iliquidez desses ativos).
Neste sentido, somente os seguintes clientes poderão participar dos financiamentos coletivos que assumam a forma descrita: (i) clientes profissionais; (ii) clientes de varejo que contam com aconselhamento financeiro; (iii) clientes de varejo classificados como corporate finance contacts ou venture capital contacts; (iv) clientes de varejo certificados como sofisticados ou de elevado patrimônio; e (v) clientes de varejo que confirmem explicitamente que não irão investir mais de 10% de seu patrimônio nesses produtos.
A FCA propõe também que onde não há aconselhamento financeiro seja aplicado o teste de adequação (appropriateness test) previsto na MiFID – ora, MiFID II –, que institui um procedimento simplificado de suitability, restrito à avaliação do conhecimento e experiência dos clientes. A intenção é garantir que as plataformas sejam um efetivo mecanismo de controle do regulador para a proteção dos investidores, evitando que os clientes incorram em riscos que não entendam ou não estejam dispostos a correr.
Em nível europeu, a Comissão Europeia, em 27/3/14, publicou uma Comunicação sobre crowdfunding que detalha as diferentes iniciativas que serão adotadas nos próximos meses.
Duas principais medidas se destacam: a criação de um Fórum Europeu de Crowdfunding, que reunirá as partes interessadas no tema através um grupo de experts no assunto, e a realização de dois estudos, um mais genérico sobre o papel do crowdfunding no sistema financeiro da região e outro relacionado ao potencial do financiamento coletivo para dar suporte financeiro a atividades de pesquisa e desenvolvimento – incluindo aí uma discussão sobre incentivos fiscais. Além disso, a Comissão estabeleceu o compromisso de acompanhar de perto o desenvolvimento deste mercado na região, de modo a definir a melhor abordagem para um eventual tratamento regulatório harmonizado do tema.
Por fim, a IOSCO publicou, em 5/2/14, um texto para discussão sobre o tema, onde pesa os principais benefícios e riscos advindos do crowdfunding.A entidade conclui que, em seu atual estágio de desenvolvimento, este mercado ainda não implica riscos sistêmicos que sejam capazes de preocupar os reguladores. Entretanto, o documento destaca diversos tipos de risco que a atividade engendra: risco de default, iliquidez, fraude, falha ou insolvência das plataformas, ataques cibernéticos e transparência.
A IOSCO ressalta que é sobre estes riscos que a regulação pode atuar, ainda que não haja um modelo único a ser adotado pelas jurisdições. Neste contexto, vale ressaltar a potencial eficácia da opção britânica, focada na regulação das plataformas, já que oferece uma possibilidade de abordar diferentes riscos associados ao crowdfunding de uma só vez na regulação, notadamente, os quatro últimos da lista acima, bem como centrar a supervisão em um único agente deste mercado.